Empresas se comprometem a remover minúsculas esferas esfoliantes de polietileno dos produtos de higiene pessoal

MINÚSCULAS ESFERAS
Um cientista filtrou minúsculas esferas de plástico, mostradas nos frascos, de cada um desses produtos de limpeza de pele. A Johnson & Johnson, fabricante destes três produtos, está eliminando o uso de microesferas de polietileno em seus produtos de higiene pessoal.
Crédito: Cortesia do 5 Gyres Institute
Por Cheryl Hogue
Chemical & Engineering News
Volume 91 Edição 37 | pp 23-25
Data de Emissão: 16 de setembro de 2013
Traduzido por Natalie Andreoli, Global Garbage Brasil
Uma variedade de produtos de limpeza de pele no mercado prometem esfoliar e desobstruir os poros. Alguns desses produtos de esfoliação contêm pequenas esferas de plástico dispersas em um gel ou uma pasta cremosa. Após a lavagem com esses produtos de limpeza, os consumidores enxaguam a área tratada – juntamente com suas minúsculas esferas – por ralo abaixo, não tendo nem sequer uma ideia do que acontece com os pedaços de plástico, que são menores do que 1 mm de diâmetro.
Recentemente, os pesquisadores estão encontrando microesferas plásticas nos Grandes Lagos. Eles dizem que as minúsculas esferas podem prejudicar animais aquáticos, que as confundem com alimento. Talvez mais preocupante, eles temem que as esferas de plástico possam ajudar a transferir poluentes tóxicos dos Grandes Lagos para a cadeia alimentar, incluindo os peixes que as pessoas comem.
Embora os estudos desses cientistas ainda não estejam publicados, os dados a partir deles, que documentam a presença de microesferas nos Grandes Lagos, têm sido compartilhados com empresas que fazem produtos de higiene pessoal que contenham as esferas. E essas empresas estão respondendo.
Os pesquisadores que estão coletando e analisando as informações sobre plásticos nos Grandes Lagos incluem um químico da SUNY Fredonia e cientistas do Instituto 5 Gyres (“5 Giros”), uma organização que luta em favor do meio ambiente, trabalhando para reduzir a poluição por plástico. Stiv J. Wilson, diretor de políticas do Instituto 5 Gyres, diz que sua organização forneceu os dados para as empresas americanas que fazem produtos de limpeza de pele ou outros produtos de higiene pessoal que contêm microesferas plásticas. A Johnson & Johnson (J&J), L’Oréal e Procter & Gamble (P&G) se comprometeram nos últimos meses a eliminar progressivamente as esferas de polietileno de seus produtos de limpeza de pele.
Mas essas empresas não foram as primeiras fabricantes de produtos de higiene pessoal a dar esse passo. Quem liderou esse movimento foi a Unilever, com sede no Reino Unido. Sob pressão de ativistas ambientais europeus, a Unilever, em dezembro de 2012, anunciou que estaria trabalhando para eliminar as microesferas de plástico nos próximos três anos. Enquanto isso, o Instituro 5 Gyres diz que a Colgate-Palmolive também se comprometeu a eliminar gradualmente as microesferas dos cremes dentais e outros produtos, mas a empresa não respondeu no prazo da C&EN para confirmar isso. Em declarações que anunciaram ou confirmaram a eliminação de microesferas de plástico, a J&J, a L’Oréal, a P&G e a Unilever não dizem o motivo ou quando, inicialmente, decidiram adicionar esferas de plástico em produtos destinados a serem liberados na água.
A descoberta de microesferas nos Grandes Lagos começou com um palpite de um químico ambiental. Cada vez mais estudos têm documentado a presença de grandes quantidades de plástico nos oceanos do mundo, aponta Sherri (Sam) Mason, professora associada de química na SUNY Fredonia. “Se nós os encontramos nos oceanos, provavelmente iremos encontrá-los na região dos Grandes Lagos”, diz ela à C&EN.
Ela fazia parte de uma equipe de pesquisadores formada no verão de 2012 para investigar essa premissa. No trabalho financiado pela Burning River Foundation (“Fundação Rio Ardente”), uma organização sem fins lucrativos de Ohio, que foca na proteção dos recursos aquáticos, eles viajaram pelos lagos: Superior, Huron e Erie para coletar amostras das águas superficiais. Para fazer isso, eles fixaram uma rede com malha de 0,33 mm à embarcação.
Os pesquisadores, então, dividiram os plásticos que coletaram em três grupos, de acordo com a maior dimensão, diz Mason. Um grupo consiste em pedaços maiores do que 5 mm. O segundo é composto de partículas entre 1 e 5 mm. A terceira categoria, os microplásticos, são pedaços com menos de 1 mm na sua maior dimensão e tão pequenos quanto 0,355 mm. Mason está focada em estudar esse último grupo.
Cada pedaço de microplástico coletado em 2012 – havia milhares – foi examinada usando um microscópio eletrônico de varredura e espectroscopia de raios-X de energia dispersiva, diz Mason. “Este é um trabalho cansativo”, ela observa. Alguns dos pequenos pedaços são fragmentos irregulares de pedaços maiores de plástico. Porém, a maioria deles é esférico, sugerindo que eles foram liberados no meio ambiente como grânulos (pellets), diz ela. Além do mais, muitos deles são do mesmo tamanho e cor, incluindo branco, azul, verde ou vermelho-alaranjado, como as pequenas esferas utilizadas em uma série de produtos de higiene pessoal, diz Mason.
A análise da coleta de plásticos de 2012 nos lagos está descrita em um artigo submetido ao Marine Pollution Bulletin (Boletim de Poluição Marinha). De acordo com Wilson, que é um coautor, o artigo seria o primeiro a documentar a poluição por grânulos plásticos (pellets) nos Grandes Lagos.
Dos plásticos coletados durante as viagens de investigação em 2012, cerca de 80% dos fragmentos são menores do que 1 mm de tamanho, diz Mason. Embora a quantidade em cada amostra tenha variado amplamente em todos os lagos estudados, os pesquisadores estimaram que encontraram uma concentração relativamente baixa de microplásticos no Lago Superior, que tem a bacia hidrográfica menos densamente povoada dos Grandes Lagos. A densidade de microplásticos encontrada na superfície do Lago Superior foi, em média, cerca de 2.400 partículas por km2. No outro extremo do espectro, a superfície do Lago Erie teve a maior densidade, com média de em torno de 80.000 partículas de microplástico por km2. A bacia hidrográfica do Lago Erie tem o maior número de pessoas e indústrias dos Grandes Lagos e isso pode ajudar a explicar seus números mais elevados de partículas de plástico, diz Mason.
A circulação de água através do sistema dos Grandes Lagos também pode ser um fator influenciando na densidade de fragmentos de microplástico na superfície, Mason ressalta. A água dos lagos Superior, Michigan e Huron eventualmente se move através do Lago Erie no caminho para o Oceano Atlântico. Isso significa que os plásticos perto da superfície desses três lagos poderiam mover-se com a água que faz a sua viagem para o mar. O Lago Erie drena através das cataratas do Niágara para o Lago Ontário, que deságua no rio São Lourenço e esse canal flui para o Atlântico. Os pesquisadores coletaram plásticos no Lago Ontário pela primeira vez no verão de 2013, e esses pedaços estão sendo examinados minuciosamente agora.
O estudo das amostras de 2012 não inclui a identificação do tipo de plástico ou plásticos nas esferas, diz Mason. Mas as partículas coletadas no verão de 2013, nos Lagos Erie, Ontário e Michigan, em um esforço financiado pela Illinois-Indiana Sea Grant e Burning River Foundation, passarão por análises para determinar as suas composições químicas, acrescenta.
A descoberta de microesferas nos Grandes Lagos tem levantado muitas questões para futuras pesquisas.”Eu tenho muitas perguntas que quero investigar”, disse Mason, acrescentando que ela está colaborando com uma série de outros cientistas para procurar respostas.
Por exemplo, os pesquisadores estão planejando experimentos para determinar se as estações de tratamento de esgoto liberam minúsculas esferas de plástico, diz Mason. Especificamente, ela e os seus colaboradores estão se preparando para estudar amostras de efluentes de estações que são despejadas nos Lagos Erie e Ontário, para verificar a presença de microplásticos.
Porém, pelo menos um fabricante de produtos de higiene pessoal descarta essa possibilidade. Em uma declaração sobre a eliminação de microesferas, a J&J diz: “Até o momento, a ciência mostra que as microesferas de produtos de higiene pessoal são removidas em sistemas de tratamento de águas residuais.”
A afirmação da J&J é novidade para a National Association of Clean Water Agencies (Associação Nacional de Agências de Água Limpas), que representa as estações de tratamento de esgoto de propriedade pública. A associação classifica as minúsculas esferas de plástico, que são desenhadas para se serem levadas pelos canos de esgoto, como um contaminante emergente, diz Chris Hornback, diretor sênior de assuntos regulatórios da associação. Os contaminantes emergentes são materiais que entram nas águas residuais, como produtos farmacêuticos, que as instalações de tratamento de esgotos não são projetadas para remover ou decompor.
Usando a tecnologia desenvolvida nas décadas de 1950 e 1960, as estações de tratamento de águas residuais dependem principalmente da ação da gravidade e microorganismos para eliminar biossólidos e outros resíduos da água antes dela ser desinfetada e liberada em rios ou lagos, diz Hornback. Mason ressalta que muitas estações de tratamento adicionam agentes floculantes para ajudar a remover materiais sólidos das águas residuais. Porém, pedaços de plástico não tendem a flocular e, portanto, não são susceptíveis de serem capturados durante o tratamento, diz ela. As microesferas de plástico tendem a flutuar e, assim, são susceptíveis a fluir com as águas residuais tratadas para ambientes aquáticos, diz Hornback à C&EN.
Além disso, outra pesquisa está focada em saber se os minúsculos grânulos de plástico retirados da superfície estão entrando na cadeia alimentar, diz Mason. Os cientistas coletaram amostras de peixes do lago durante suas viagens de investigação neste verão e irão analisar o conteúdo de seus estômagos para a presença de plásticos.
Pequenos peixes e zooplâncton podem estar se alimentando de microplásticos porque as partículas são aproximadamente do mesmo tamanho que o alimento deles. Se esses animais estiverem ingerindo as partículas, o plástico pode interferir na absorção de nutrientes ou até mesmo obstruir fisicamente suas vísceras, explica Mason.
Há uma outra preocupação também. Os pesquisadores estão preocupados que substâncias tóxicas persistentes encontradas nos Grandes Lagos, como bifenilas policloradas (PCBs), podem adsorver ao plástico e serem liberadas nos corpos de animais aquáticos que ingerem as minúsculas partículas. O plástico pode servir como um veículo para as substâncias tóxicas moverem-se para dentro dos peixes e, em seguida, para aqueles que os comem, incluindo os seres humanos e aves, diz Mason. Wilson salienta que as microesferas têm uma grande razão superfície/volume, uma característica explorada em equipamentos de laboratório em que as microesferas são usadas para separar materiais ou moléculas. Isso poderia fazer com que as esferas de plástico encontradas nos Grandes Lagos fossem eficientes veículos de poluentes tóxicos, diz ele.
Olhando para a questão da contaminação por microesferas a partir de uma perspectiva maior, Wilson diz que toda a poluição por plástico nos oceanos e lagos é um problema. Mas a adição de minúsculas esferas plásticas em produtos de higiene pessoal destinados a ir para o ralo e para o meio ambiente é “notória”, diz ele. Isso reflete a falta de análise do ciclo de vida, que é a chave para a sustentabilidade, continua ele. Diante disso, as campanhas dos ativistas ambientais contra o uso de minúsculas esferas em produtos de higiene pessoal apresentaram às empresas “um pesadelo muito sério de relações públicas”, afirma Wilson. “Eles reconhecem que isso é indefensável”.
A Unilever anunciou a eliminação de minúsculas esferas de plástico em produtos de higiene pessoal sob pressão da Plastic Soup Foundation (Fundação Sopa de Plástico), uma organização que luta em favor do meio ambiente, com sede na Holanda, que visa reduzir a quantidade de plástico no oceano. A Unilever aponta em sua declaração: “A quantidade de plástico no ambiente marinho que se acredita que seja originada da utilização de esferas de plástico esfoliantes em produtos de higiene pessoal é considerada limitada em comparação com outras fontes.” Porém, considerando a crescente quantidade e impacto potencial desses fragmentos de plástico, a Unilever planeja completar sua eliminação mundial de microesferas em 2015. A empresa diz que está “explorando alternativas adequadas que melhor podem corresponder à experiência sensorial que as esferas esfoliantes de plástico proporcionam”.
Assim como a Unilever, a J&J fez a sua declaração anunciando a eliminação de microesferas de polietileno, no contexto da poluição marinha por plástico. “As prováveis fontes de microplásticos nos oceanos são a partir da fragmentação das garrafas e sacos plásticos descartados”, diz a J&J. Levando em conta as preocupações dos consumidores, ela diz: “Nós queremos que nossos produtos de beleza e de cuidados para bebês reflitam as necessidades atuais e futuras dos consumidores, para que eles sempre tenham tranquilidade ao usar nossos produtos”. A empresa diz que está avaliando a segurança ambiental de “uma alternativa promissora” para as esferas de polietileno.
A L’Oréal, uma terceira empresa que está eliminando as microesferas, possui a The Body Shop, uma marca de produtos de higiene pessoal considerada como social e ambientalmente consciente. Wilson diz que a 5 Gyres encontrou microesferas nos itens da The Body Shop. A L’Oréal afirma que “está comprometida em garantir que todos os nossos produtos tenham o melhor perfil ambiental” e realiza pesquisas sobre os impactos de seus itens sobre os ecossistemas aquáticos. A L’Oréal diz que não vai desenvolver novos produtos utilizando microesferas de polietileno como esfoliantes e “a empresa favorece a substituição deles em suas fórmulas existentes, sempre que possível.”
Uma porta-voz da P&G disse à C&EN que sua empresa vai substituir as microesferas de polietileno “assim que alternativas estiverem disponíveis e sua conformidade esteja absolutamente comprovada”. A empresa pretende eliminar gradualmente as esferas em nível global ao longo dos próximos anos, com a eliminação completa o mais tardar em 2017.
À medida que essas empresas trabalham para acabar com a utilização de microesferas, a pressão dos consumidores sobre as empresas para eliminar progressivamente as minúsculas esferas de plástico em produtos de higiene pessoal está pronta para crescer em todo o mundo.
A Plastic Soup Foundation oferece um aplicativo para smartphones chamado “Beat the Microbead” (“Combata as microesferas”). Com isso, os consumidores podem escanear o código de barras de um produto e saber se ele contém as minúsculas esferas de plástico. O aplicativo conta com um banco de dados que o grupo montou através da compra de dezenas de produtos de higiene pessoal e verificação deles para a presença de microesferas. Wilson ressalta que determinar se um produto contém microesferas pode ser feito facilmente diluindo o produto e passando-o através de um filtro de café, para capturar quaisquer grânulos.
O aplicativo foi desenvolvido inicialmente para o mercado europeu. Maria Westerbos, diretora da Plastic Soup, disse à C&EN que o grupo vai lançar uma versão do aplicativo gratuito expandida, mais global, no início de outubro.
A esperança de Wilson é que as esferas de microplástico intencionalmente adicionadas aos produtos de higiene pessoal, em breve tornem-se uma coisa do passado. Ele diz: “Este é um exemplo de um projeto mal feito e um problema solucionável”.
Coletar e examinar
Pesquisadores retiraram fragmentos de microplástico, incluindo esferas brancas e azuis, das superfícies dos Grandes Lagos (acima). Dezenas de esferas podem cobrir a cabeça de Abraham Lincoln em uma moeda de um centavo de dólar (centro). A micrografia eletrônica de varredura mostra a desagregação de uma microesfera com o tempo, na região dos Grandes Lagos (abaixo).

Esta é uma foto de uma rede afixada ao navio que coleta plástico nos Grandes Lagos.
Crédito: Cortesia do 5 Gyres Institute

Esta é uma foto que mostra partículas de plástico com menos de 1 mm, incluindo esferas de plástico, sobre o Presidente Lincoln, em uma moeda de um centavo de dólar.
Crédito: Cortesia do 5 Gyres Institute

Micrografia Eletrônica de Varredura que mostra microesferas de plástico desagregadas, em função da ação do tempo, coletadas nos Grandes Lagos.
Crédito: Cortesia do 5 Gyres Institute
Nota do tradutor: C&EN – Chemical & Engineering News (Notícias de Química e Engenharia) é uma revista semanal publicada pela American Chemical Society (Sociedade Americana de Química), que fornece informação técnica e profissional nas áreas de química e engenharia química.